O
termo Diplomacia segundo a definição do dicionário eletrônico Hoauiss, é a
“ciência, arte e prática das relações internacionais entre Estados. ” A partir
dessa base, as seguintes acepções procuram ressaltar o vocábulo como uma
possível forma de praticar relacionamento entre dois países no mundo. Nesse sentido,
o conceituado autor Noberto Bobbio define a palavra utilizando o dicionário
Oxford que diz: “´é a condução das relações internacionais através de
negociações. O método através do qual estas relações são reguladas e mantidas
por embaixadores e encarregados; o oficio ou a arte do diplomata. ” (Bobbio,
1998:348). Ele agrega em relação a primeira definição, qual é o instrumento e quem
pratica a diplomacia. O primeiro é feito pela negociação, enquanto que o
segundo é feito pelos seguintes profissionais: embaixadores, encarregados de
negócios e diplomatas. Mas afinal quem
são esses profissionais?
A
Convenção de Viena assinada em 1961 com o intuito de estabelecer relações diplomáticas
com regras mais objetivas e claras, diz em seu artigo primeiro, alínea e, que
Agente Diplomático “é o Chefe da Missão ou um membro do pessoal diplomático da
Missão. ”. Essa definição oficial deixa espaço para dúvidas, já que ela
pretende ser bem concisa nas suas acepções. Entretanto, para aumentar o
entendimento vale a pena compreender o conceito de Missão para essa legislação,
que no artigo 3º define as suas funções:
”a)
representar o Estado acreditante perante o Estado acreditado; b) proteger no
Estado acreditado os interesses do Estado acreditante e de seus nacionais,
dentro dos limites permitidos pelo direito internacional; c) negociar com o
governo do Estado acreditado; d) inteirar-se por todos os meios lícitos das
condições existentes e da evolução dos acontecimentos no Estado acreditado e
informar a esse respeito o governo do Estado acreditante; e) promover relações
amistosas e desenvolver as relações econômicas, culturais e cientificas entre o
Estado acreditante e o Estado acreditado. “ (1961:p.2)
Percebe-se
que os verbos representar, negociar, promover, proteger e etc, apresentam-se como condição necessária para que o
profissional responsável pela diplomacia utilize quando estiver em outro
país. Apesar da apresentação do profissional que exerce o vocábulo, ainda
existe espaço para aprofundamento do vocábulo diplomacia. Esse debate será
feito em seguida com um diálogo conciso sobre a palavra para alguns pensadores/atores
de relações internacionais, tais como, Aron, Morgenthau, Wight, Bull, Wilson,
Kant e Ministério das Relações Exteriores do Brasil (MRE).
O
autor Raymond Aron, de forma breve recorre a ligação entre diplomacia e guerra
para tentar explicar a palavra. Ele defende que no século XX existiu várias
formas de praticar a diplomacia, como por exemplo, a diplomacia econômica ou a militar. Mas que elas não são
preponderantes diante da guerra, que é uma característica latente no sistema
internacional ao longo do tempo. Talvez falte ao autor uma conceituação mais aprofundada sobre o termo, mas fica claro que a diplomacia é secundária para
ele.
O
trabalho de Hans Morgenthau define claramente a diplomacia como “um dos
elementos de poder nacional” (Morgenthau, 2003: p.967), onde um dos seus
objetivos é garantir o interesse nacional por meios pacíficos. Ele vai mais
além ao definir quatro funções para ela:
“(1)
a diplomacia precisa determinar os seus objetivos à luz do poder disponível,
tanto de fato como em potencial, para a consecução desses objetivos; (2) a
diplomacia tem de ser capaz de avaliar os objetivos das outras nações e o poder
disponível, tanto de fato como em potencial, para a consecução desses
objetivos; (3) a diplomacia precisa determinar até que ponto esses diferentes
objetivos são compatíveis entre si; (4)
a diplomacia tem de empregar os meios apropriados para a concretização de seus objetivos.”
(Morgenthau, 2003: p.968)
Acredita-se
que o autor dialoga constantemente com a diplomacia e o poder, de maneira bem
ligada a perspectiva realista, que enxerga a diplomacia como mais um
instrumento para exercer poder no mundo. É vital recordar que o autor escreve a
sua obra cânone, a Política entre as
nações: a luta pelo poder e a paz, durante o sistema bipolar, em que
EUA e URSS disputavam a preponderância do poder mundial, especialmente por meio
de uma corrida armamentista nuclear entre os aos de 1945-1960. Portanto, para Morgenthau, a diplomacia
era um instrumento de poder, que servia não apenas para chegar à paz, mas para
garantir força no cenário internacional.
Em
a política de poder, o autor
Martin Wight procura definir a diplomacia como “(...) o sistema e a arte de
comunicação entre os estados. O sistema diplomático é a instituição mestra das
relações internacionais. ” (Wight, 2002: 107). Percebe-se que diferente do realista Morgenthau, o representante da escola inglesa pretende dar uma importância maior ao jogo diplomático, pois coloca a
palavra na categoria de sistema e ao mesmo tempo de instituição das relações
internacionais, isto é, o núcleo do relacionamento interestatal. Ele pretende
categorizar a diplomacia em dois campos: a diplomacia tradicional e a
diplomacia revolucionária. A primeira está ligada a prática ocidental desde o
século XV nas cidades italianas (Florença, Veneza, etc) até o século XX com a
diplomacia pública americana. A segunda está ligada aos regimes autoritários
desde o século XVIII (seja durante a Revolução Francesa) até o século XX (seja o
fascismo, nazismo ou comunismo soviético ou chinês) que possuem três funções:
“espionagem ao invés de informação, subversão ao invés de negociação,
propaganda ao invés de comunicação. ” (Wight, 2002: 111-112). Essa diferenciação
para o autor é fundamental porque demonstra qual é o tipo de diplomacia que precisa ser
utilizada na sociedade internacional, a diplomacia tradicional, apesar de que
ela estava em decadência na visão do teórico. Na
mesma perspectiva da escola inglesa, Hedley Bull, aluno de Wight, em Sociedade Anárquica, pretende definir o que é diplomacia e
qual a sua ligação com a ordem internacional. Para além de definir a diplomacia
de forma tradicional, como a Convenção de Viena de 1961, que considerou somente
as relações entre os Estados, ele pretende dar uma tipologia a palavra. Ele
começa caracterizando o vocábulo dizendo “que diplomacia inclui tanto a
formulação quanto a execução da política externa de um Estado. ” (Bull, 2002:
190). Logo em seguida, define que relações diplomáticas podem ser bilaterais ou
multilaterais, nesta última vai incluir as organizações internacionais como
produtoras de diplomacia, afastando-se das definições tradicionais que incluem
somente o ente estatal. A terceira característica é que “a diplomacia pode ser ad hoc ou institucionalizada” (Bull,
2002: 191), ou seja, ela poder ser informal ou permanente entre os atores
internacionais. Finalmente, a quarta característica é as distinções entre os
ramos diplomáticos e consulares, este se ocupando da relação dos cidadãos com
os governos estrangeiros e seus súditos, aquele se ocupando da relação entre os
governos. Essa caracterização é fundamental porque o autor pretende colocar a
diplomacia como um instrumento que aceita e reforça a sociedade internacional,
já que a “(...) própria profissão diplomática custodia a ideia de sociedade
internacional, pois seu interesse é preservá-la e fortalece-la. ” (Bull, 2002:
210).
Além
de utilizar teóricos das relações internacionais, é importante usar atores
internacionais que praticaram ou alteraram a diplomacia, no caso do presidente
Woodron Wilson, que em 1917 cunhou os 14 pontos para a superação do conflito
bélico da primeira guerra, onde o primeiro ponto dizia: “Open covenants of
Peace, openly arrived at, after which there shall be no private international
understandings of any kind, but diplomacy shall proceed Always frankly and in the public view” (grifo meu. Wilson, 1918: p.1).
A diplomacia na visão wilsoniana deveria ser opinião pública diferenciando
da diplomacia europeia do século XIX, que era feita baseada na tradição da realpolitik, isto é, de forma secreta. Para o vencedor do
Nobel da paz, o segredo em diplomacia era o motivo principal para o surgimento
de conflitos no mundo. Essa sua tradição bebe na fonte de Immanuel Kant, que no
livro Paz Perpétua, em seu
artigo preliminar, diz que: “Não deve considerar-se como válido nenhum tratado
de paz que se tenha feito com a reserva secreta de elementos para uma guerra. ”
(Kant, s/d: p.4). Veja, que um dos pais fundadores da corrente idealista já
colocava em 1795 como um perigo a busca pela paz verdadeira, as cláusulas
secretas para novos conflitos, em outras palavras, ele já reconhecia no século
XVIII o costume corriqueiro da pratica diplomática secreta entre as nações. Aproveitando-se
do conceito de diplomacia pública wilsoniano, no século XXI, o Ministério das Relações
Exteriores do Brasil ampliou o debate ao concluir que:
“
Tradicionalmente, o conceito de “diplomacia pública” esteve associado à
promoção da imagem de um país no exterior. No Brasil, a “diplomacia pública” é
entendida não só nessa acepção tradicional, mas também no sentido de maior
abertura do Ministério das Relações Exteriores e da política externa brasileira
à sociedade civil, em um esforço de democratização e transparência das
políticas públicas nacionais. ” (Brasil, s/d: p.1)
O
Itamaraty buscou nos últimos anos um diálogo mais fluido com a academia e
sociedade, utilizando seus instrumentos tradicionais de comunicação aliando a
produção das suas ações na internet. Foram criados o blog do Itamaraty, os
diálogos de política externa e as redes sociais (twitter, facebook,
etc). A diplomacia, portanto, nesse viés tornou-se mais ampla e próxima da
sociedade, ao dialogar com mecanismos modernos de comunicação de suas políticas
públicas.
A
termo de conclusão, a diplomacia não é um conceito fechado e acabado, mas sim
multifocal, onde diversos pontos de vistas podem ser escolhidos. Desde
definições mais óbvias de dicionários (Houaiss, Bobbio), passando por
documentos legais (Convenção de Viena, MRE, 14 pontos de Wilson) e finalizando
em visões acadêmicas (Aron, Morgenthau, Wight, Bull, Kant).
.
Bibliografia
Livros
ARON,
Raymond. Estudos Políticos. Brasília: UnB, 1985.
BOBBIO,
Noberto. Dicionário de política. Trad. Carmen C, Varriale et ai.; coord. trad.
João Ferreira; rev. geral João Ferreira e Luis Guerreiro Pinto Cacais. Brasília: Editora Universidade de
Brasília, 1ª ed., 1998.
BULL,
Hedley. A sociedade anárquica.
Brasília: UnB, 2002.
HOUAISS,
Antônio. Dicionário Houaiss da língua portuguesa eletrônico- versão monousuário
3.0.
Rio de Janeiro: Editora Objetiva, 2009.
KANT,
Immanuel. A Paz Perpétua e outros opúsculos. Lisboa: Edições 70, s/d. A paz perpétua.
MORGENTHAU,
Hans J. A política entre as nações: A luta pelo poder e pela paz. - Brasília: UnB, 2003.
WIGHT,
Martin. A política do poder. Brasília: UnB, 2002.
Documentos
BRASIL.
Diplomacia pública. Brasília:
Ministério das Relações Exteriores, s/d. Acessado em:18/07/2016, disponível no
endereço eletrônico: <www.itamaraty.gov.br/pt-BR/diplomacia-publica>.
CONVENÇAO
DE VIENA SOBRE RELAÇOES DIPLOMATICAS de 1961. Acessado em 18/07/2016,
disponível no endereço eletrônico: <www.cedin.com.br>.
WILSON,
Woodron. The fourteen points. EUA:
s/e, 1918.
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