domingo, 14 de agosto de 2016

O que significa Diplomacia?



O termo Diplomacia segundo a definição do dicionário eletrônico Hoauiss, é a “ciência, arte e prática das relações internacionais entre Estados. ” A partir dessa base, as seguintes acepções procuram ressaltar o vocábulo como uma possível forma de praticar relacionamento entre dois países no mundo. Nesse sentido, o conceituado autor Noberto Bobbio define a palavra utilizando o dicionário Oxford que diz: “´é a condução das relações internacionais através de negociações. O método através do qual estas relações são reguladas e mantidas por embaixadores e encarregados; o oficio ou a arte do diplomata. ” (Bobbio, 1998:348). Ele agrega em relação a primeira definição, qual é o instrumento e quem pratica a diplomacia. O primeiro é feito pela negociação, enquanto que o segundo é feito pelos seguintes profissionais: embaixadores, encarregados de negócios e diplomatas.  Mas afinal quem são esses profissionais? 
A Convenção de Viena assinada em 1961 com o intuito de estabelecer relações diplomáticas com regras mais objetivas e claras, diz em seu artigo primeiro, alínea e, que Agente Diplomático “é o Chefe da Missão ou um membro do pessoal diplomático da Missão. ”. Essa definição oficial deixa espaço para dúvidas, já que ela pretende ser bem concisa nas suas acepções. Entretanto, para aumentar o entendimento vale a pena compreender o conceito de Missão para essa legislação, que no artigo 3º define as suas funções: 
 
”a) representar o Estado acreditante perante o Estado acreditado; b) proteger no Estado acreditado os interesses do Estado acreditante e de seus nacionais, dentro dos limites permitidos pelo direito internacional; c) negociar com o governo do Estado acreditado; d) inteirar-se por todos os meios lícitos das condições existentes e da evolução dos acontecimentos no Estado acreditado e informar a esse respeito o governo do Estado acreditante; e) promover relações amistosas e desenvolver as relações econômicas, culturais e cientificas entre o Estado acreditante e o Estado acreditado. “  (1961:p.2)       

Percebe-se que os verbos representar, negociar, promover, proteger e etc, apresentam-se como condição necessária para que o profissional responsável pela diplomacia utilize quando estiver em outro país. Apesar da apresentação do profissional que exerce o vocábulo, ainda existe espaço para aprofundamento do vocábulo diplomacia. Esse debate será feito em seguida com um diálogo conciso sobre a palavra para alguns pensadores/atores de relações internacionais, tais como, Aron, Morgenthau, Wight, Bull, Wilson, Kant e Ministério das Relações Exteriores do Brasil (MRE). 
O autor Raymond Aron, de forma breve recorre a ligação entre diplomacia e guerra para tentar explicar a palavra. Ele defende que no século XX existiu várias formas de praticar a diplomacia, como por exemplo, a diplomacia econômica ou a militar. Mas que elas não são preponderantes diante da guerra, que é uma característica latente no sistema internacional ao longo do tempo. Talvez falte ao autor uma conceituação mais aprofundada sobre o termo, mas fica claro que a diplomacia é secundária para ele. 
O trabalho de Hans Morgenthau define claramente a diplomacia como “um dos elementos de poder nacional” (Morgenthau, 2003: p.967), onde um dos seus objetivos é garantir o interesse nacional por meios pacíficos. Ele vai mais além ao definir quatro funções para ela: 
“(1) a diplomacia precisa determinar os seus objetivos à luz do poder disponível, tanto de fato como em potencial, para a consecução desses objetivos; (2) a diplomacia tem de ser capaz de avaliar os objetivos das outras nações e o poder disponível, tanto de fato como em potencial, para a consecução desses objetivos; (3) a diplomacia precisa determinar até que ponto esses diferentes objetivos  são compatíveis entre si; (4) a diplomacia tem de empregar os meios apropriados para a concretização de seus objetivos.” (Morgenthau, 2003: p.968)      

Acredita-se que o autor dialoga constantemente com a diplomacia e o poder, de maneira bem ligada a perspectiva realista, que enxerga a diplomacia como mais um instrumento para exercer poder no mundo. É vital recordar que o autor escreve a sua obra cânone, a Política entre as nações: a luta pelo poder e a paz, durante o sistema bipolar, em que EUA e URSS disputavam a preponderância do poder mundial, especialmente por meio de uma corrida armamentista nuclear entre os aos de 1945-1960. Portanto, para Morgenthau, a diplomacia era um instrumento de poder, que servia não apenas para chegar à paz, mas para garantir força no cenário internacional. 
Em a política de poder, o autor Martin Wight procura definir a diplomacia como “(...) o sistema e a arte de comunicação entre os estados. O sistema diplomático é a instituição mestra das relações internacionais. ” (Wight, 2002: 107). Percebe-se que diferente do realista Morgenthau, o representante da escola inglesa pretende dar uma importância maior ao jogo diplomático, pois coloca a palavra na categoria de sistema e ao mesmo tempo de instituição das relações internacionais, isto é, o núcleo do relacionamento interestatal. Ele pretende categorizar a diplomacia em dois campos: a diplomacia tradicional e a diplomacia revolucionária. A primeira está ligada a prática ocidental desde o século XV nas cidades italianas (Florença, Veneza, etc) até o século XX com a diplomacia pública americana. A segunda está ligada aos regimes autoritários desde o século XVIII (seja durante a Revolução Francesa) até o século XX (seja o fascismo, nazismo ou comunismo soviético ou chinês) que possuem três funções: “espionagem ao invés de informação, subversão ao invés de negociação, propaganda ao invés de comunicação. ” (Wight, 2002: 111-112). Essa diferenciação para o autor é fundamental porque demonstra qual é o tipo de diplomacia que precisa ser utilizada na sociedade internacional, a diplomacia tradicional, apesar de que ela estava em decadência na visão do teórico. Na mesma perspectiva da escola inglesa, Hedley Bull, aluno de Wight, em Sociedade Anárquica, pretende definir o que é diplomacia e qual a sua ligação com a ordem internacional. Para além de definir a diplomacia de forma tradicional, como a Convenção de Viena de 1961, que considerou somente as relações entre os Estados, ele pretende dar uma tipologia a palavra. Ele começa caracterizando o vocábulo dizendo “que diplomacia inclui tanto a formulação quanto a execução da política externa de um Estado. ” (Bull, 2002: 190). Logo em seguida, define que relações diplomáticas podem ser bilaterais ou multilaterais, nesta última vai incluir as organizações internacionais como produtoras de diplomacia, afastando-se das definições tradicionais que incluem somente o ente estatal. A terceira característica é que “a diplomacia pode ser ad hoc ou institucionalizada” (Bull, 2002: 191), ou seja, ela poder ser informal ou permanente entre os atores internacionais. Finalmente, a quarta característica é as distinções entre os ramos diplomáticos e consulares, este se ocupando da relação dos cidadãos com os governos estrangeiros e seus súditos, aquele se ocupando da relação entre os governos. Essa caracterização é fundamental porque o autor pretende colocar a diplomacia como um instrumento que aceita e reforça a sociedade internacional, já que a “(...) própria profissão diplomática custodia a ideia de sociedade internacional, pois seu interesse é preservá-la e fortalece-la. ” (Bull, 2002: 210). 
Além de utilizar teóricos das relações internacionais, é importante usar atores internacionais que praticaram ou alteraram a diplomacia, no caso do presidente Woodron Wilson, que em 1917 cunhou os 14 pontos para a superação do conflito bélico da primeira guerra, onde o primeiro ponto dizia: “Open covenants of Peace, openly arrived at, after which there shall be no private international understandings of any kind, but diplomacy shall proceed Always frankly and in the public view” (grifo meu. Wilson, 1918: p.1). A diplomacia na visão wilsoniana deveria ser opinião pública diferenciando da diplomacia europeia do século XIX, que era feita baseada na tradição da realpolitik, isto é, de forma secreta. Para o vencedor do Nobel da paz, o segredo em diplomacia era o motivo principal para o surgimento de conflitos no mundo. Essa sua tradição bebe na fonte de Immanuel Kant, que no livro Paz Perpétua, em seu artigo preliminar, diz que: “Não deve considerar-se como válido nenhum tratado de paz que se tenha feito com a reserva secreta de elementos para uma guerra. ” (Kant, s/d: p.4). Veja, que um dos pais fundadores da corrente idealista já colocava em 1795 como um perigo a busca pela paz verdadeira, as cláusulas secretas para novos conflitos, em outras palavras, ele já reconhecia no século XVIII o costume corriqueiro da pratica diplomática secreta entre as nações. Aproveitando-se do conceito de diplomacia pública wilsoniano, no século XXI, o Ministério das Relações Exteriores do Brasil ampliou o debate ao concluir que: 
“ Tradicionalmente, o conceito de “diplomacia pública” esteve associado à promoção da imagem de um país no exterior. No Brasil, a “diplomacia pública” é entendida não só nessa acepção tradicional, mas também no sentido de maior abertura do Ministério das Relações Exteriores e da política externa brasileira à sociedade civil, em um esforço de democratização e transparência das políticas públicas nacionais. ” (Brasil, s/d: p.1)

O Itamaraty buscou nos últimos anos um diálogo mais fluido com a academia e sociedade, utilizando seus instrumentos tradicionais de comunicação aliando a produção das suas ações na internet. Foram criados o blog do Itamaraty, os diálogos de política externa e as redes sociais (twitter, facebook, etc). A diplomacia, portanto, nesse viés tornou-se mais ampla e próxima da sociedade, ao dialogar com mecanismos modernos de comunicação de suas políticas públicas. 
A termo de conclusão, a diplomacia não é um conceito fechado e acabado, mas sim multifocal, onde diversos pontos de vistas podem ser escolhidos. Desde definições mais óbvias de dicionários (Houaiss, Bobbio), passando por documentos legais (Convenção de Viena, MRE, 14 pontos de Wilson) e finalizando em visões acadêmicas (Aron, Morgenthau, Wight, Bull, Kant).        
                   .           
Bibliografia

Livros

ARON, Raymond. Estudos Políticos. Brasília: UnB, 1985.

BOBBIO, Noberto. Dicionário de política.  Trad. Carmen C, Varriale et ai.; coord. trad. João Ferreira; rev. geral João Ferreira e Luis Guerreiro Pinto Cacais. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1ª ed., 1998.

BULL, Hedley. A sociedade anárquica. Brasília: UnB, 2002.

HOUAISS, Antônio. Dicionário Houaiss da língua portuguesa eletrônico- versão monousuário 3.0.  Rio de Janeiro: Editora Objetiva, 2009.

KANT, Immanuel. A Paz Perpétua e outros opúsculos. Lisboa: Edições 70, s/d. A paz perpétua.

MORGENTHAU, Hans J. A política entre as nações: A luta pelo poder e pela paz.  - Brasília: UnB, 2003.

WIGHT, Martin. A política do poder. Brasília: UnB, 2002.
Documentos

BRASIL. Diplomacia pública. Brasília: Ministério das Relações Exteriores, s/d. Acessado em:18/07/2016, disponível no endereço eletrônico: <www.itamaraty.gov.br/pt-BR/diplomacia-publica>. 

CONVENÇAO DE VIENA SOBRE RELAÇOES DIPLOMATICAS de 1961. Acessado em 18/07/2016, disponível no endereço eletrônico:  <www.cedin.com.br>.

WILSON, Woodron. The fourteen points. EUA: s/e, 1918.

Nenhum comentário:

Postar um comentário